quarta-feira, 17 de março de 2010
CHICO ALENCAR ABRE FOGO NA CÂMARA DOS DEPUTADOS CONTRA MÁFIA AMBIENTAL DE "ARMAÇÃO" DOS BÚZIOS !!!
Pronunciamento
(Do Senhor Deputado Chico Alencar, PSOL/RJ)
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados e todo(a)s o(a)s que assistem a esta sessão ou nela trabalham:
No final de 2008, tanto o juiz João Carlos Correa, da 1ª Vara da Comarca de Armação dos Búzios, quanto o Sr. Ruy Barbosa, hoje Secretário de Planejamento do município, questionaram relato que fiz, nesta tribuna, sobre problemas vividos pela jornalista Beth Prata, que se sentia ameaçada. Estas autoridades, que, de certa forma, cobravam ‘retratação’ de minha parte, são os principais personagens de uma página inteira do jornal O Globo no dia 07/03/10, que transcrevo. Lamento pelo povo de Búzios, que não merece isso.
Sentenças suspeitas em Búzios: Corregedoria recolhe 17 processos e investiga decisões de juiz em disputas fundiárias
Uma série de decisões polêmicas, tomadas em processos sobre disputas fundiárias em uma das cidades mais caras e badaladas do litoral fluminense, chamou a atenção da Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para Búzios, na Região dos Lagos. Na mira dos magistrados da corregedoria, que estiveram no balneário no início de fevereiro, está o juiz João Carlos de Souza Correa, titular da 1ª Vara da comarca. Depois de dois dias entre Rio de Janeiro, Búzios e Cabo Frio, três magistrados de Brasília, acompanhados de outros dois da Corregedoria do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), recolheram peças de 17 processos para investigação.
O corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp, na portaria que autoriza a inspeção em Búzios, informa que João Carlos já foi alvo de duas denúncias por conduta indevida — uma delas por supostamente favorecer um advogado que alega ser o dono de uma área de mais de cinco milhões de metros quadrados em Tucuns, uma das áreas mais nobres do balneário. Além disso, o documento cita uma exceção de suspeição (alegação de parcialidade do juiz) num outro processo, acolhida pela 1ª Câmara Cível do TJ, que reconheceu interesse do magistrado numa decisão proferida a favor de um empreendimento imobiliário em área de proteção ambiental, também em Tucuns.
Juízes estranharam denúncia arquivada
A 1ª Vara de Búzios começou a ser investigada quando os juízes auxiliares do CNJ recolheram documentos da Corregedoria do TJ-RJ, no curso das investigações contra o desembargador Roberto Wider (corregedor afastado em janeiro), e estranharam um “arquivamento sumário” de uma denúncia contra o juiz João Carlos. Na sequência, encontraram uma representação apresentada por moradores de Búzios contra o juiz.
Pelo menos três dos processos recolhidos na inspeção estão relacionados a disputas imobiliárias. Os juízes suspeitam que o colega de Búzios teria tomado decisões — com a suposta participação de cartórios de imóveis — que teriam favorecido grileiros e grandes empreendedores imobiliários do lugar. De acordo com corretores de imóveis locais, o preço do metro quadrado na cidade pode atingir até mil reais.
Um dos focos da investigação é a distribuição dirigida de processos, contrariando a regra da designação aleatória do juiz. O outro é a suspeita da existência de um esquema de legalização irregular de terras.
Como muitos registros são antigos, usando marcos subjetivos — como pedras, rios, córregos — para servir de referência dos limites, os responsáveis tirariam proveito dessa subjetividade para “criar” áreas dentro de outras legais, de terceiros. Quando ocorria algum problema no registro em cartório, as dúvidas eram justamente decididas pelo juiz João Carlos.
Um dos processos investigados envolve a disputa de uma área de 91 mil metros quadrados próxima à Praia da Ferradurinha, em Geribá, entre o engenheiro George de Oliveira Torres, favorecido por decisão provisória do juiz, e José Ricardo Jesus dos Santos, que afirma ser representante dos herdeiros de João Luiz Alegre, primeiro proprietário do terreno.
A briga gerou dois processos judiciais. Em ambos, a distribuição foi anormal. O primeiro, uma ação de interdito proibitório (receio do proprietário de ser molestado na posse por violência iminente) movida por José Ricardo contra George, foi distribuído 11 vezes, no dia 29 de setembro do ano passado, até chegar às mãos do juiz João Carlos.
O segundo processo, um pedido de reintegração de posse da mesma área ajuizado por George e outros dois autores, um deles o prefeito de Niterói, Jorge Roberto Silveira (PDT), sofreu duas distribuições até parar na 1ª Vara da comarca. Apesar de a área estar em litígio e dos processos suspensos, há uma obra em andamento no local.
Outro processo suspeito decide o destino de uma praia inteira da cidade, Tucuns — entre os bairros Pórtico de Búzios e Capão —, e de partes de uma área de proteção ambiental, a APA do Pau-Brasil. O terreno, de mais de cinco milhões de metros quadrados, é reclamado pelo advogado Arakem Rosa desde a década de 70. Mas a área está povoada, há muitas décadas, por centenas de famílias de posseiros.
Em 2004, João Carlos homologou um acordo extrajudicial entre a prefeitura e Arakem, que se comprometeu a conceder títulos às famílias que apresentassem provas documentais de que não eram invasoras, em troca do reconhecimento de que o advogado seria dono de toda a área. O problema é que, até hoje, ninguém conseguiu atender à exigência. E o juiz, sem esperar pelo julgamento do mérito, determinou a remoção coercitiva, com o corte de luz das residências. Além disso, representantes dos moradores alegam que o advogado apresentou documentos fraudulentos para aumentar a extensão do terreno.
Procurado, um representante do advogado negou qualquer irregularidade e afirmou que o caso foi resolvido, uma vez que os direitos de Arakem sobre a área teriam sido reconhecidos pela Justiça.
Outro processo investigado é o licenciamento de um empreendimento imobiliário em Geribá. Nele, o juiz deferiu e, logo depois, revogou uma liminar que sustava a construção do condomínio Summertime no Campo de Pouso (área onde havia um antigo estacionamento), a pedido do promotor de Justiça Murilo Bustamante, que movera uma ação civil pública contra a obra. O MP alegou que, além de irregular — pois a área só comportaria 17 casas, enquanto o condomínio previa a construção de 34 —, a licença concedida pela prefeitura havia sido grosseiramente fraudada. Mesmo provando a adulteração, o MP foi surpreendido com a liberação judicial da obras, em dezembro do ano passado, pelo mesmo juiz que a suspendera.
Magistrado se diz vítima de difamação
O juiz João Carlos de Souza Correa alegou em sua defesa que o procedimento investigativo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) só aconteceu devido a uma campanha difamatória, movida por uns poucos moradores de Búzios, que se sentiram insatisfeitos com decisões tomadas dentro da lei. Ele afirmou que a maior parte das representações que recebeu na Corregedoria do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) é oriunda do mesmo grupo. O juiz disse ainda que tomou a iniciativa de suspender todos os processos investigados enquanto aguarda uma decisão de Brasília:
— Até agora, não fui informado pelo CNJ sobre o trabalho que está sendo feito.
Sobre as suspeitas de distribuição dirigida, o juiz atribuiu o problema a um erro involuntário de uma funcionária, provocado por uma falha técnica no sistema. Para ele, se havia suspeita de distribuição dirigida, caberia à parte afetada reclamar à Justiça, o que garantiu não ter ocorrido.
João Carlos disse ainda que as decisões liminares em favor de supostos proprietários se sustentam em registros de propriedade apresentados pelos autores, bem como em decisões tomadas por instâncias superiores do TJ-RJ.
O juiz, que atua na comarca desde 2004, anunciou que pretende, tão logo o Tribunal de Justiça abra vagas, pedir sua remoção para outra comarca, pois estaria exausto de enfrentar reações a sentenças proferidas por ele com base na legislação vigente.
— Vou sair porque isso está desgastando a minha saúde — concluiu o magistrado.
Secretário agrediu diretor de jornal
Palco de disputas que chamaram a atenção do CNJ, Búzios foi cenário, recentemente, de uma outra polêmica, digna do roteiro da telenovela “O bem amado”, de Dias Gomes. No dia 11 de fevereiro, o secretário de Planejamento do município, Ruy Borba Filho, agrediu o diretor do jornal “O Perú Molhado”, Marcelo Lartigue, depois de invadir a redação. O caso foi parar na delegacia, onde o secretário alegou que se sentiu ofendido com uma reportagem. Já o agredido afirmou que o ataque foi desmedido.
A prefeitura disse que o incidente foi um caso isolado, de caráter pessoal, e que não representa sua postura com a imprensa. Mas admitiu que o secretário não foi advertido.
Agradeço a atenção,
Sala das Sessões, 16 de março de 2010.
Chico Alencar
Deputado Federal, PSOL/RJ
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