sábado, 25 de abril de 2009
JUSTIÇA BRASILEIRA "UM HALL DE FAVORECIMENTOS"
Gilmar Mendes foi nomeado para o Supremo Tribunal Federal pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. Em artigo publicado na Folha de S. Paulo, o professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (Largo São Francisco) Dalmo de Abreu Dallari , professor catedrático da UNESCO na cadeira Educação para a paz, Direitos Humanos e Democracia e Tolerância, declarou:
Se essa indicação (de Gilmar Mendes) vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional. (...) o nome indicado está longe de preencher os requisitos necessários para que alguém seja membro da mais alta corte do país.
(DALLARI, Dalmo de Abreu)
Gilmar Mendes tentou processar criminalmente o jurista Dallari por esse artigo, mas a Justiça recusou a instauração da ação penal que o já ministro Mendes pretendia mover contra o advogado Dalmo Dallari: "A crítica, como expressão de opinião, é a servidão que há de suportar (...) quem se encontrar catalogado no rol das figuras importantes", escreveu o juiz do caso Silvio Rocha, citando uma sentença publicada na Espanha.
Segundo o jornal Folha de S. Paulo, para conseguir ter sua indicação aprovada no Senado Federal, Gilmar Mendes precisou contar com uma "mobilização tucana": "registros do Senado mostram que a base de apoio ao governo tucano se mobilizou para garantir aprovação de Mendes para o cargo". Teve 15 votos contrários à sua efetivação, o triplo do segundo candidato ao posto com maior rejeição, o ministro Eros Grau.
Durante o período como ministro do STF, assumiu o cargo de vice-presidente no mandato da ministra Ellen Gracie. Em 23 de abril de 2008, foi empossado presidente do STF para o biênio 2008-2010. Na véspera de tomar posse como presidente do STF determinou, nos autos da reclamação n. 2186, o arquivamento de duas ações de improbidade administrativa contra dois dos ex-ministros do governo Fernando Henrique Cardoso, Pedro Malan e José Serra. O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega, também havia opinado no sentido do deferimento da reclamação dos então ministros Pedro Malan e José Serra. Mendes foi subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil no governo FHC, entre 1996 e 2000, e advogado-geral da União, entre 2000 e 2002.
Críticas e o Caso Daniel Dantas-Opportunity
Em 11 de julho de 2008, foi alvo de violentas reações contrárias à sua atuação como presidente e ministro do Supremo Tribunal Federal. Primeiramente, quarenta e dois procuradores da República divulgaram nesse dia, uma carta aberta à sociedade brasileira, na qual lamentam a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal no habeas corpus que libertou o banqueiro Daniel Dantas da prisão pela primeira vez, no dia 9 de julho:
«As instituições democráticas foram frontalmente atingidas pela falsa aparência de normalidade dada ao fato de que decisões proferidas por juízos de 1ª instância possam ser diretamente desconstituídas pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, suprimindo-se a participação do Tribunal Regional Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Definitivamente não há normalidade na flagrante supressão de instâncias do Judiciário brasileiro, sendo, nesse sentido, inédita a absurda decisão proferida pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal. Não se deve aceitar com normalidade o fato de que a possível participação em tentativa de suborno de Autoridade Policial não sirva de fundamento para o decreto de prisão provisória. Definitivamente não há normalidade na soltura, em tempo recorde, de investigado que pode ter atuado decisivamente para corromper e atrapalhar a legítima atuação de órgãos estatais.
(Procuradores da República em Carta Aberta)
No final do mesmo dia, 134 juízes federais da Magistratura Federal da Terceira Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul) divulgaram carta de apoio ao juiz federal da 6ª Vara, Fausto Martin de Sanctis, responsável por expedir o pedido de prisão do banqueiro Daniel Dantas, em um manifesto público no qual demonstraram sua "indignação com a atitude" de Gilmar Mendes.
Não se vislumbra motivação plausível para que um juiz seja investigado por ter um determinado entendimento jurídico. Ao contrário, a independência de que dispõe o magistrado para decidir é um pilar da democracia e princípio constitucional consagrado. Ninguém nem nada podem interferir na livre formação da convicção do juiz, no direito de decidir segundo sua consciência, pena de solaparem-se as próprias bases do Estado de Direito. Prestamos, pois, nossa solidariedade ao colega Fausto de Sanctis e deixamos clara nossa discordância para com este ato do Ministro Gilmar Mendes, que coloca em risco o bem tão caro da independência do Poder Judiciário.
(Juízes Federais da Terceira Região)
Esse manifesto, ainda aberto a novas adesões, já tinha reunido mais de 400 assinaturas de juízes federais até o dia 14 de julho.
Da mesma forma, a Associação de Delegados da Polícia Federal (ADPF) divulgou uma nota à imprensa criticando a decisão do presidente do STF, ministro Mendes, de suspender a prisão preventiva do banqueiro Daniel Dantas em desacordo com a jurisprudência dominante. A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), entidade de âmbito nacional e que congrega mais de 13 mil juízes de todo o Brasil, entre estaduais, trabalhistas, federais e militares, juntou-se às demais em apoio ao juiz Fausto Martin de Sanctis:
A independência do magistrado constitui pedra fundamental do Estado Democrático de Direito e garantia indissociável do exercício da atividade jurisdicional, merecendo repulsa veemente toda tentativa de menosprezá-la ou diminuí-la.
( Associação dos Magistrados Brasileiros.)
Segundo declarou Wálter Fanganiello Maierovitch, Desembargador (aposentado) do Tribunal de Justiça de São Paulo, (presidente e fundador do Instituto Brasileiro Giovani Falconi de Ciências Criminais (Istituto Brasilano di Scienze Criminali Giovanni Falcone), professor de pós-graduação em direito penal e processual penal, professor-visitante da Universidade de Georgetown em Washington-EUA, e conselheiro da Associação Brasileira dos Constitucionalistas — Instituto Pimenta Bueno, da Universidade de São Paulo — USP), em entrevista concedida à Rádio CBN no dia 10 de julho, houve flagrante precipitação de Gilmar Mendes na concessão desse habeas corpus, e o uso de algemas está incluído no poder discricionário das polícias de todo o mundo, declarando ainda que o ministro Gilmar Mendes, nesse caso, teria "rasgado a jurisprudência do Supremo" — o único precedente seria a soltura de outro banqueiro, Salvatore Cacciola, que fugiu — e que "o Supremo é um órgão colegiado e que somente em casos excepcionalíssimos pode um único ministro antecipar a decisão dos dez outros."[20][21] Em entrevista concedida para o Portal do Terra ao jornalista Diego Salmen, Maierovitch diz que já é hora de pensar num impeachment do presidente do Supremo. Para Maierovitch, o novo habeas corpus concedido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, ao banqueiro Daniel Dantas mostra que o presidente do STF estaria "extrapolando suas funções":
Ele (Gilmar Mendes) está atuando com abuso de direito. Está extrapolando as funções dele. O Supremo virou ele.
(MAIEROVITCH, Wálter Fanganiello)
No mesmo sentido, o presidente da OAB-RJ, Wadih Damous, condenou a ofensiva de Mendes, dizendo ver com muita preocupação o episódio:
O Judiciário, de uma maneira geral, vem interferindo exageradamente na vida cotidiana, nas relações sociais e nas atividades políticas". (...) O STF está legislando. A súmula vinculante editada no caso das algemas, não tem qualquer precedente judicial. (...) A decisão prejudica a capacidade de discernimento do agente policial.
(DAMOUS, Wadih, presidente da OAB-RJ)
Em sentido contrário, entretanto, juristas como o professor de Direito da Universidade Católica de Brasília e da Uni-DF, Moacir Calderón, consideraram que as decisões do ministro Gilmar Mendes não extrapolaram o que prevê a legislação brasileira. Para Calderón, as reações contrárias ao ministro Gilmar Mendes soam como exageradas, assim como a colocação de que foi instalada uma crise no Judiciário brasileiro.
Entendo que a postura do ministro, de não entender existirem razões para a prisão preventiva, foi perfeitamente cabível na interpretação da norma. Os incomodados que mudem a lei. Às vezes um leigo discorda por desconhecer o conteúdo da matéria. Gilmar Mendes é um ministro muito bem preparado, com pós-doutorado na Alemanha, ampla e reconhecida bagagem em matéria constitucional. Não vejo razão para crise. São mais alegações políticas
(Moacir Calderón, professor de Direito da Universidade Católica de Brasília e da Uni-DF)
BBC de Londres
A celeuma foi noticiada pela BBC News, que qualificou alguns episódios de "bizarros":
uma importante disputa se desatou no Poder Judiciário do Brasil em torno de uma investigação sobre corrupção em que um empresário foi preso e posto em liberdade duas vezes em 48 horas”. (...) Em cada oportunidade, o presidente do Supremo Tribunal Federal do Brasil (STF), Gilmar Mendes, ordenou a libertação do empresário Daniel Dantas. (...) Noutro episódio bizarro o gabinete do presidente (do Supremo) foi varrido eletronicamente para detectar equipamentos de escuta depois de denúncias de que o mesmo juiz teria autorizado a polícia (federal) a monitorar o gabinete. Nada foi encontrado e o juiz de Sanctis repeliu essa acusação.
BBC News
Em outra decisão, Gilmar Mendes concedeu habeas corpus (HC n. 95227), em caráter liminar, a todos os suspeitos de emitir trinta mil habilitações falsas em Ferraz de Vasconcelos (São Paulo), entre eles, delegados e donos de auto-escolas detidos na Operação Carta Branca, reformando assim a decisão dos juízes de primeira instância. Segundo o ministro, "a prisão preventiva foi decretada de forma genérica para todos os denunciados, apresentando os mesmos fundamentos para justificar a custódia cautelar".
Em 26 de agosto de 2008, o Ministério Público Federal, por intermédio da Procuradoria-Geral da República, entregou seu parecer concordando com a soltura de todos os suspeitos.
Impeachment
Alguns Procuradores Regionais da República, membros do Ministério Público Federal, estudaram fazer um abaixo-assinado solicitando o impeachment de Mendes. O ministro afirmou não temer "ameaça" ou "retaliação".
Não tem nenhum cabimento (o impeachment). Eu compreendo que os procuradores fiquem contrariados com a eventual frustração de algum resultado de seu trabalho. Mas isso não justifica nenhuma outra medida. Eu não tenho nenhum medo desse tipo de ameaça e retaliação.
(Ministro Gilmar Mendes)
Ridículo, foi como o senador Demóstenes Torres classificou esse movimento de Procuradores Regionais da República. Para o senador de Goiás, a chance de um processo como esse prosperar na Casa "é zero".
Um pedido de impeachment significaria que ele é suspeito. O Ministério Público está extrapolando. O Gilmar Mendes sempre foi uma pessoa não querida pelo Ministério Público. Trata-se de uma atitude política, que só tem como objetivo constranger o ministro.
(Senador Demóstenes Torres)
O presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN) acreditou que eram mínimas as chances de o pedido prosperar.
Já o líder do PSDB, Arthur Virgílio Neto (PSDB-AM), considerado pela revista Veja como "parte de uma bancada sensível aos interesses do dono do Opportunity" [29] qualificou a atitude do Ministério Público como “precipitada”. Acrescentou que julgar um eventual pedido de impeachment contra Gilmar Mendes “não é como ir a uma esquina e comprar limão”[30]. Em nota à imprensa, o senador Arthur Virgílio também advertiu que "atitudes impensadas" como a dos procuradores pode levar o país a um clima semelhante ao que propiciou "a instalação do Terceiro Reich, na Alemanha".
A Central Única dos Trabalhadores (CUT/DF) do Distrito Federal protocolou, dia 18 de julho de 2008, na Secretaria-Geral do Senado, o pedido de impeachment do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes. O pedido alega que o ministro tomou decisões "de modo incompatível com a honra, dignidade e decoro de suas funções, ao agir de forma não esperada por um magistrado"
No mesmo dia, a AMB divulgou nota contra o pedido de "impeachment" apresentado pela CUT/DF. A AMB afirma, no documento, que o "impeachment" é um importante instrumento de fortalecimento da democracia, mas que "somente pode ser utilizado de maneira responsável e fundamentada, não sendo admissível o seu manejo para atacar conteúdo de decisão judicial". A Nota divulgada pela AMB também afirma que a independência dos ministros do STF e o teor de suas decisões "não podem ser alvos de qualquer tipo de censura ou represália, muito menos objeto de pedido de impeachment".
Ao longo da sua história, o Supremo Tribunal Federal vem desempenhando o seu relevante papel institucional, assegurando cumprimento da Constituição e o exercício da cidadania. A independência dos seus ministros e o teor das suas decisões judiciais não podem ser alvos de qualquer tipo de censura ou represália, muito menos objeto de pedido de impeachment.
(Nota pública emitida pela Associação dos Magistrados Brasileiros — AMB
O pedido de "impeachment" acabou sendo arquivado pelo presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), em 22 de julho de 2008. No despacho encaminhado à Secretaria-Geral do Senado, Garibaldi recomendou o arquivamento do pedido porque ausentes "elementos jurídicos".
Beth Prata
Coordenadora do Nucleo Búzios
Se essa indicação (de Gilmar Mendes) vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional. (...) o nome indicado está longe de preencher os requisitos necessários para que alguém seja membro da mais alta corte do país.
(DALLARI, Dalmo de Abreu)
Gilmar Mendes tentou processar criminalmente o jurista Dallari por esse artigo, mas a Justiça recusou a instauração da ação penal que o já ministro Mendes pretendia mover contra o advogado Dalmo Dallari: "A crítica, como expressão de opinião, é a servidão que há de suportar (...) quem se encontrar catalogado no rol das figuras importantes", escreveu o juiz do caso Silvio Rocha, citando uma sentença publicada na Espanha.
Segundo o jornal Folha de S. Paulo, para conseguir ter sua indicação aprovada no Senado Federal, Gilmar Mendes precisou contar com uma "mobilização tucana": "registros do Senado mostram que a base de apoio ao governo tucano se mobilizou para garantir aprovação de Mendes para o cargo". Teve 15 votos contrários à sua efetivação, o triplo do segundo candidato ao posto com maior rejeição, o ministro Eros Grau.
Durante o período como ministro do STF, assumiu o cargo de vice-presidente no mandato da ministra Ellen Gracie. Em 23 de abril de 2008, foi empossado presidente do STF para o biênio 2008-2010. Na véspera de tomar posse como presidente do STF determinou, nos autos da reclamação n. 2186, o arquivamento de duas ações de improbidade administrativa contra dois dos ex-ministros do governo Fernando Henrique Cardoso, Pedro Malan e José Serra. O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega, também havia opinado no sentido do deferimento da reclamação dos então ministros Pedro Malan e José Serra. Mendes foi subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil no governo FHC, entre 1996 e 2000, e advogado-geral da União, entre 2000 e 2002.
Críticas e o Caso Daniel Dantas-Opportunity
Em 11 de julho de 2008, foi alvo de violentas reações contrárias à sua atuação como presidente e ministro do Supremo Tribunal Federal. Primeiramente, quarenta e dois procuradores da República divulgaram nesse dia, uma carta aberta à sociedade brasileira, na qual lamentam a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal no habeas corpus que libertou o banqueiro Daniel Dantas da prisão pela primeira vez, no dia 9 de julho:
«As instituições democráticas foram frontalmente atingidas pela falsa aparência de normalidade dada ao fato de que decisões proferidas por juízos de 1ª instância possam ser diretamente desconstituídas pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, suprimindo-se a participação do Tribunal Regional Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Definitivamente não há normalidade na flagrante supressão de instâncias do Judiciário brasileiro, sendo, nesse sentido, inédita a absurda decisão proferida pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal. Não se deve aceitar com normalidade o fato de que a possível participação em tentativa de suborno de Autoridade Policial não sirva de fundamento para o decreto de prisão provisória. Definitivamente não há normalidade na soltura, em tempo recorde, de investigado que pode ter atuado decisivamente para corromper e atrapalhar a legítima atuação de órgãos estatais.
(Procuradores da República em Carta Aberta)
No final do mesmo dia, 134 juízes federais da Magistratura Federal da Terceira Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul) divulgaram carta de apoio ao juiz federal da 6ª Vara, Fausto Martin de Sanctis, responsável por expedir o pedido de prisão do banqueiro Daniel Dantas, em um manifesto público no qual demonstraram sua "indignação com a atitude" de Gilmar Mendes.
Não se vislumbra motivação plausível para que um juiz seja investigado por ter um determinado entendimento jurídico. Ao contrário, a independência de que dispõe o magistrado para decidir é um pilar da democracia e princípio constitucional consagrado. Ninguém nem nada podem interferir na livre formação da convicção do juiz, no direito de decidir segundo sua consciência, pena de solaparem-se as próprias bases do Estado de Direito. Prestamos, pois, nossa solidariedade ao colega Fausto de Sanctis e deixamos clara nossa discordância para com este ato do Ministro Gilmar Mendes, que coloca em risco o bem tão caro da independência do Poder Judiciário.
(Juízes Federais da Terceira Região)
Esse manifesto, ainda aberto a novas adesões, já tinha reunido mais de 400 assinaturas de juízes federais até o dia 14 de julho.
Da mesma forma, a Associação de Delegados da Polícia Federal (ADPF) divulgou uma nota à imprensa criticando a decisão do presidente do STF, ministro Mendes, de suspender a prisão preventiva do banqueiro Daniel Dantas em desacordo com a jurisprudência dominante. A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), entidade de âmbito nacional e que congrega mais de 13 mil juízes de todo o Brasil, entre estaduais, trabalhistas, federais e militares, juntou-se às demais em apoio ao juiz Fausto Martin de Sanctis:
A independência do magistrado constitui pedra fundamental do Estado Democrático de Direito e garantia indissociável do exercício da atividade jurisdicional, merecendo repulsa veemente toda tentativa de menosprezá-la ou diminuí-la.
( Associação dos Magistrados Brasileiros.)
Segundo declarou Wálter Fanganiello Maierovitch, Desembargador (aposentado) do Tribunal de Justiça de São Paulo, (presidente e fundador do Instituto Brasileiro Giovani Falconi de Ciências Criminais (Istituto Brasilano di Scienze Criminali Giovanni Falcone), professor de pós-graduação em direito penal e processual penal, professor-visitante da Universidade de Georgetown em Washington-EUA, e conselheiro da Associação Brasileira dos Constitucionalistas — Instituto Pimenta Bueno, da Universidade de São Paulo — USP), em entrevista concedida à Rádio CBN no dia 10 de julho, houve flagrante precipitação de Gilmar Mendes na concessão desse habeas corpus, e o uso de algemas está incluído no poder discricionário das polícias de todo o mundo, declarando ainda que o ministro Gilmar Mendes, nesse caso, teria "rasgado a jurisprudência do Supremo" — o único precedente seria a soltura de outro banqueiro, Salvatore Cacciola, que fugiu — e que "o Supremo é um órgão colegiado e que somente em casos excepcionalíssimos pode um único ministro antecipar a decisão dos dez outros."[20][21] Em entrevista concedida para o Portal do Terra ao jornalista Diego Salmen, Maierovitch diz que já é hora de pensar num impeachment do presidente do Supremo. Para Maierovitch, o novo habeas corpus concedido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, ao banqueiro Daniel Dantas mostra que o presidente do STF estaria "extrapolando suas funções":
Ele (Gilmar Mendes) está atuando com abuso de direito. Está extrapolando as funções dele. O Supremo virou ele.
(MAIEROVITCH, Wálter Fanganiello)
No mesmo sentido, o presidente da OAB-RJ, Wadih Damous, condenou a ofensiva de Mendes, dizendo ver com muita preocupação o episódio:
O Judiciário, de uma maneira geral, vem interferindo exageradamente na vida cotidiana, nas relações sociais e nas atividades políticas". (...) O STF está legislando. A súmula vinculante editada no caso das algemas, não tem qualquer precedente judicial. (...) A decisão prejudica a capacidade de discernimento do agente policial.
(DAMOUS, Wadih, presidente da OAB-RJ)
Em sentido contrário, entretanto, juristas como o professor de Direito da Universidade Católica de Brasília e da Uni-DF, Moacir Calderón, consideraram que as decisões do ministro Gilmar Mendes não extrapolaram o que prevê a legislação brasileira. Para Calderón, as reações contrárias ao ministro Gilmar Mendes soam como exageradas, assim como a colocação de que foi instalada uma crise no Judiciário brasileiro.
Entendo que a postura do ministro, de não entender existirem razões para a prisão preventiva, foi perfeitamente cabível na interpretação da norma. Os incomodados que mudem a lei. Às vezes um leigo discorda por desconhecer o conteúdo da matéria. Gilmar Mendes é um ministro muito bem preparado, com pós-doutorado na Alemanha, ampla e reconhecida bagagem em matéria constitucional. Não vejo razão para crise. São mais alegações políticas
(Moacir Calderón, professor de Direito da Universidade Católica de Brasília e da Uni-DF)
BBC de Londres
A celeuma foi noticiada pela BBC News, que qualificou alguns episódios de "bizarros":
uma importante disputa se desatou no Poder Judiciário do Brasil em torno de uma investigação sobre corrupção em que um empresário foi preso e posto em liberdade duas vezes em 48 horas”. (...) Em cada oportunidade, o presidente do Supremo Tribunal Federal do Brasil (STF), Gilmar Mendes, ordenou a libertação do empresário Daniel Dantas. (...) Noutro episódio bizarro o gabinete do presidente (do Supremo) foi varrido eletronicamente para detectar equipamentos de escuta depois de denúncias de que o mesmo juiz teria autorizado a polícia (federal) a monitorar o gabinete. Nada foi encontrado e o juiz de Sanctis repeliu essa acusação.
BBC News
Em outra decisão, Gilmar Mendes concedeu habeas corpus (HC n. 95227), em caráter liminar, a todos os suspeitos de emitir trinta mil habilitações falsas em Ferraz de Vasconcelos (São Paulo), entre eles, delegados e donos de auto-escolas detidos na Operação Carta Branca, reformando assim a decisão dos juízes de primeira instância. Segundo o ministro, "a prisão preventiva foi decretada de forma genérica para todos os denunciados, apresentando os mesmos fundamentos para justificar a custódia cautelar".
Em 26 de agosto de 2008, o Ministério Público Federal, por intermédio da Procuradoria-Geral da República, entregou seu parecer concordando com a soltura de todos os suspeitos.
Impeachment
Alguns Procuradores Regionais da República, membros do Ministério Público Federal, estudaram fazer um abaixo-assinado solicitando o impeachment de Mendes. O ministro afirmou não temer "ameaça" ou "retaliação".
Não tem nenhum cabimento (o impeachment). Eu compreendo que os procuradores fiquem contrariados com a eventual frustração de algum resultado de seu trabalho. Mas isso não justifica nenhuma outra medida. Eu não tenho nenhum medo desse tipo de ameaça e retaliação.
(Ministro Gilmar Mendes)
Ridículo, foi como o senador Demóstenes Torres classificou esse movimento de Procuradores Regionais da República. Para o senador de Goiás, a chance de um processo como esse prosperar na Casa "é zero".
Um pedido de impeachment significaria que ele é suspeito. O Ministério Público está extrapolando. O Gilmar Mendes sempre foi uma pessoa não querida pelo Ministério Público. Trata-se de uma atitude política, que só tem como objetivo constranger o ministro.
(Senador Demóstenes Torres)
O presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN) acreditou que eram mínimas as chances de o pedido prosperar.
Já o líder do PSDB, Arthur Virgílio Neto (PSDB-AM), considerado pela revista Veja como "parte de uma bancada sensível aos interesses do dono do Opportunity" [29] qualificou a atitude do Ministério Público como “precipitada”. Acrescentou que julgar um eventual pedido de impeachment contra Gilmar Mendes “não é como ir a uma esquina e comprar limão”[30]. Em nota à imprensa, o senador Arthur Virgílio também advertiu que "atitudes impensadas" como a dos procuradores pode levar o país a um clima semelhante ao que propiciou "a instalação do Terceiro Reich, na Alemanha".
A Central Única dos Trabalhadores (CUT/DF) do Distrito Federal protocolou, dia 18 de julho de 2008, na Secretaria-Geral do Senado, o pedido de impeachment do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes. O pedido alega que o ministro tomou decisões "de modo incompatível com a honra, dignidade e decoro de suas funções, ao agir de forma não esperada por um magistrado"
No mesmo dia, a AMB divulgou nota contra o pedido de "impeachment" apresentado pela CUT/DF. A AMB afirma, no documento, que o "impeachment" é um importante instrumento de fortalecimento da democracia, mas que "somente pode ser utilizado de maneira responsável e fundamentada, não sendo admissível o seu manejo para atacar conteúdo de decisão judicial". A Nota divulgada pela AMB também afirma que a independência dos ministros do STF e o teor de suas decisões "não podem ser alvos de qualquer tipo de censura ou represália, muito menos objeto de pedido de impeachment".
Ao longo da sua história, o Supremo Tribunal Federal vem desempenhando o seu relevante papel institucional, assegurando cumprimento da Constituição e o exercício da cidadania. A independência dos seus ministros e o teor das suas decisões judiciais não podem ser alvos de qualquer tipo de censura ou represália, muito menos objeto de pedido de impeachment.
(Nota pública emitida pela Associação dos Magistrados Brasileiros — AMB
O pedido de "impeachment" acabou sendo arquivado pelo presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), em 22 de julho de 2008. No despacho encaminhado à Secretaria-Geral do Senado, Garibaldi recomendou o arquivamento do pedido porque ausentes "elementos jurídicos".
Beth Prata
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